ALGUMA PAZ
ALGUMA PAZ
Neste riacho e nesta pedra me sento,
Onírica paz, num chilrear de pássaros,
Em amena sombra em que descanso,
Revigorante frescura, vinda de Norte,
Ora flauta, ou fagote, soprada melodia,
Falando-me em segredo e doce mote,
Perdida no meio de sibilante melancolia;
Neste paraíso me confesso, me baptizo,
Mergulhado em incógnitas de meu juízo...
Mas nem tudo é perfeito, tão-pouco real
E neste bom tempero há demasiado sal,
Águas torcidas, percursos de amargura,
Nalgum serpentear, límpido, mas lento,
De correntes insípidas, amarga secura,
Em bebedeiras da vida e trivial procura...
É um girar do rodízio, de tão pouca dura,
Moendo o pão que o diabo irá amassar,
Na força motriz de qual água a passar
E que me faz esquecer alguns reparos
Na minha existência, enquanto penso.
Aqui me declaro neste confesso afronto,
Tamanha e contínua luta de sobressalto,
Na suave neblina matinal, que se dissipa
E enquanto me refresco, de alma limpa,
Nesta água cristalina, célere sem cansar,
Procurando um rio, esperança pro mar...
Ai!... Como eu gostaria de ter asas, voar
Ao longo do teu deslizar, sobre ti sonhar,
Fugir para essas e longínquas paragens,
Matar minha sede em outras margens,
Regar meus pés nesse teu sedoso leito,
Procurar-te no melhor e ao meu jeito,
Lavar minhas chagas, alguns prantos,
Descansar, finalmente, de tormentos...
( Manuel Nunes Francisco ©® )