Ah, como adorava saber a data final, Procurando uns quantos, até ao limite, Fazer-lhes de minha justiça artesanal... O certo, que por outras alturas tal cite!...
Podem revelar os vossos sentimentos E acrescentando que sou filho da puta, Pois não vos sou lençol e ornamentos... E tampouco me interessa essa disputa!...
Ah, tanto queria ter tal conhecimento, Dar-lhes quantos e merecidos coices, Colocando à solta tal feito juramento!...
Nunca que lhes tenha seguido as falas, Mas ouvindo searas a minhas foices... Adorava partir fazendo-lhes as malas!...
Tenho pena e tal me mete nojo, Esta geração de quatro décadas, Embora alguns de outro amojo, Pelas tantas mentes desnatadas... Sei que essa culpa não será dela, Pois que cozinharam tal servido, Tudo numa igual ilusória panela E feito um qualquer reles cozido!... A maioria, são gerações da treta, Acomodados, em acções de fruir... Esse futuro é imagem de silhueta, Pelo tamanho falso mundo a ruir!... Falam de liberdade, pobres seres, Pois que a receberam e venderam, Entregando-se a quantos favores, Na prova que nunca a mereceram!... E vão cagando postas de pescada, Dumas pescas que outros fizeram, Tudo lhes servindo, de mão dada, De redes e das artes que colheram... Geração de uns maus cozinhados, Aquecidos em chamas de ilusões, Em fornos e fogões assombrados, Sustentando e sorrindo a cabrões... Pensando-se os mais inteligentes, Não ouvindo uns velhos andantes, Feitos de cu pro ar, subservientes E um tanto de grilos bem-falantes!...
A vida é uma faca de dois gumes, Aquele pau de dois bicos, Místico amor, feito de azedumes, Seja dos pobres, ou ricos!... É corrente de ribeira à solta, Melodia, num piar de aves, Calma, após alguma revolta, Filha das noites mais suaves... Ai, a vida, essa incompreendida, Descendente de um paraíso E talhada em haste retorcida!... Quem me dera ter sido dono da vida, Desde o nascer, à despedida E ter ganho, mais cedo, juízo!...
Lisboa, do triste fado, Do Tejo, traineiras e gaivotas, De um percurso desencontrado, De subidas e ruas tortas... Do castelo e sete colinas, De um passado pombalino, Terremoto e tristes sinas, Entregue ao seu destino... Lisboa, de tantos amores, Desilusões e luz de pinturas, Uns quantos dissabores, Presa a quantas diabruras... Lisboa, de ocultos mistérios, Tantas coisas por contar, Dos mais simples, aos mais sérios E tanto sonho para despertar... Lisboa, do fado e capital, Deste mar em que toma banho, Misturando doce com sal, Numa amálgama e tal tamanho... Lisboa, envelhecida e tão menina, Irrequieta e maliciosa, Adulta e parecendo pequenina, Em cama feita e deliciosa... Lisboa, de nocturnas guitarradas, Risos e de certas lágrimas, De vidas desfeitas e abençoadas, Feita rainha de tantas almas... Lisboa, Lisboa, tal Lisboa, Feita em altos e baixos, Percorrida um tanto à toa E senhora de quantos caprichos!...
Pão e vinho, umas bejecas, Sardinhas gordas, bem assadas, Uns couratos para acompanhar, Fado e futebol, um pouco de religião, Coscuvilhice pela vida alheia, Mais importante que a própria vida, Um circo bem montado em São Bento, Não importa se com bilhetes de lamentos, De um povo que bate palmas, Empenhando as suas almas, Já sem pão para sustento, Nem passos que atinjam metas, Vivendo na maior confusão, Enquanto outros de barriga cheia, Na forma mais desmedida, Dando ouvidos a vozes desalmadas, Sem travarem, enquanto tempo de parar!... É este o meu povo, No seu orgulho e sangue lusitano, Não procurando nada de novo, Num deixa andar tão tamanho, Indolente e deveras tacanho, Pobre de mente e de seu pano!... Gente, que encostou, acomodada, Nuvem negra de quantos antepassados, Que pensam andar acordados, Mortos-vivos e deambulando, Prisioneiros de crenças e de bancos, Vivendo nos seus encantos, Na maioria pasmados, Em quantos sonos desencontrados, Por pesadelos de uma vida assombrada E sem entenderem esse seu fado, Num eterno cabresto de jumentos... Este povo, que também é meu, Mas entregue ao espírito que morreu!...