Mar, esse que alguém disse haver ir e voltar!... Porém, talvez que de longe ignorando, Aquilo que a aventura tinha traçado, Além do mar e em que tal povo iria navegar E sem que ainda houvesse tal mérito alcançado... Seriam tantas as ondas, como barcos a conquistar, Quantos por esse mar tristemente naufragando!... Outrora houve remos, coragem, em quanto vigor, Velas que se afastavam da costa em rigor, Barcos, cascos desenhados à procura de horizontes E, além dos horizontes, houve terras aos montes... Tudo morreu, assim que essas naus encalharam, Enquanto os marinheiros se iam afogando, Salvo os ratos de porão e cujos à arriba se deram!... O que restava da proeza foi-se afastando da costa, Enquanto os sonhos se foram diluindo na espuma, Sem que novas ondas se fossem manifestando, Arrastando o sal que se perdeu dos temperos, Deste país de marinheiros, navegando na bruma, Num desajeitado remar, tão prestes a naufragar, Perdidos neste tempo e nos seus desesperos E que tudo entregam ao comodismo do encosta!... Os mares perderam-se, tal como a rota de navegação, Afundou-se a língua, assim como toda uma história E, por arraste, foi-se tudo o que restava de glória... Todos dormem no conformismo e pensam ter razão!... Resta-nos um povo subserviente, à beira-mar estagnado, Adormecido, profeta da ilusão e sem rota de alto-mar, Navegando neste pântano, entre águas putrefactas, Ancorado no mais diverso porto e de há muito resignado, Afundando-se, pois que o casco já pouco tem para dar, Tão-pouco os ventos correm, nem ondas que sejam fartas!... É, então, isto o que restou da nossa gloriosa alma de mar, Em toda a mudança de ventos e sem velas a acompanhar!...
Já tenho todas e mais precisas peças, Para a ideal construção de uma nave, Fazer certa viagem daqui para fora, Levando neste peito os que mereçam E se te levo, ou não, tal não me peças, Pois ainda não tenho sítio, nem enclave, Muito menos sabendo o dia e a hora, Mas há-os a quem peço que desapareçam!...
Será uma nau um tanto especial, Repleta de luz, amor e esperança, Embora simples e pelo mais modesto, Em nada de riquezas e rancores, Tendo uma desconhecida rota celestial, Mas que seja espaço de mudança, Onde o porteiro seja alguém honesto, Puro, humilde e distribuindo flores...
No entanto, precisarei do vosso auxílio, Pelo que essa construção não será fácil, Requerendo uma infinita mão de obra, Assim como mentes que tal possam ajudar... E acreditem que ninguém irá para o exílio, Tampouco por traços a qual forma dócil, Havendo compreensão e verdade de sobra, Bastando, meramente, colher e oferendar!...
Quem és, no que fazes, Por onde anda a tua mão, Que fazem os teus dedos, Nesse corpo estouvado, Em movimentos audazes, Já perdido da razão, Esquecido de quais medos, Todo ele demais ousado?...
Procurado e corpo esse, Entrelaçado num outro E tudo sabendo a pouco, Com tudo o que acontece, Em nada que se confesse, Nem havendo que seja neutro, Num momento mais louco E chama que não arrefece?...
Seja naquilo que faças E tanto mais que queiras, Não resistes à tentação, Nem tens receio da audácia, Pois as horas são escassas, Tampouco olhas a maneiras, Falando-te o coração, Em cura da melhor farmácia!...
O que és e faças, não importa, O que interessa é o momento, Sem olhar ao preconceito, Em tudo estampado no rosto, Seguindo a vida que bate à porta E dando asas ao sentimento, Abrindo a alma do peito, Trancando qual tabu imposto!...
Não me deixam descansar, os malvados, Vêm com o raiar do Sol, pela madrugada, Fazendo barulho e por nada se calam, Andam num frenesim, a manhã inteira, Contentes, nessa sua própria maneira, Acordando uns, no que outros embalam, Nalguma bela sinfonia e tão prendada, Em cada vez maior silêncio, de saciados... Mas saltitam, por cada ramo e terreno, Esgravatam tudo e procurando viver, Aqui debicam, enquanto além defecam, Ainda cantarolando e parecendo bailar, Fazendo-me esquecer a vida de veneno, Refrescando-me as instâncias do saber, Omitir seres, que por este mundo pecam E pouco entendem todo este cantarolar!...
Diz-me quem és tu, temente ou não a um deus E se perdido às orações, mas servindo de juiz, O inquisidor, sempre com um dedo apontado, A quantos e tal não sejam de tanto semelhante, Apregoando a tolerância, pela tua intolerância E atropelando pensamentos que não esses teus, Cego no que afirmas e surdo ao que outro diz, Na busca de enforcar um qualquer desgraçado, Vendendo mandamentos e nessa fé arrogante, Dobrado ao altar divino e na tua conveniência?... Rezas, dizes-te santo, mas podre da sociedade, Escavas no privado, onde o Diabo não procura, Mas sentes gozo, comer-lhes a carne e os ossos, Sem olhares ao teu redor, àquilo que pertences, No seio da família, por toda uma lista de amigos, Ao que o mundo é traiçoeiro e oculta a verdade, Toda essa disfarçada, um tanto demasiado dura... Por conseguinte, diz-me se não sentes remorsos, Pondo achas ao lume e sair do fogo que mereces, Sacudindo as faúlhas, em fuga de lumes antigos?...
Não há filme, teatro, mais belo que a natureza, Por mais perfeito o palco e tamanha encenação!... Não há escrita, poesia, descrevendo tal beleza, Sendo o verde e animais, rios, a mais bela visão!...
As rochas, as florestas e tantas areias ancestrais, O mar, a sua espuma e ondas, nalgum vai e vem, As gaivotas, os pobres corvos, o piar dos pardais, O Sol, o vento, a chuva, seja o que o mundo tem!...
As nuvens, sejam negras, ou claras e por tão belo, Num admirar pôr-do-sol, com a euforia das águas, Deslizando sobre a praia, quebrando quanto gelo...
As mágoas de solidão, talvez que uns desamores, Elevando-nos ao alto, fazendo com a vida tréguas E pelo qual a natureza será dos mais altos valores!...
Haja quem conheça qualquer caminho, senão no seu terminal, Sendo a incógnita do início todo o prazer absoluto num final E somente aí se ouvirá o grito da vitória explosiva da resposta... Razão tinha o poeta, pois "Deus quer, o homem sonha, a obra nasce"! ... O mundo, nesta tão efémera passagem, é simplesmente dos loucos!... Eu, neste tão tresloucado que sou, serei mais um louco desmedido, Tentando, pelas mais desbravadas veredas, a mais sublime aposta, Nalgum controlo do desconhecido, sempre que a adrenalina cresce E naquilo, na maior parte da existência, que tanto nos é escondido... Assim, prefiro a conta abastada da vida, a quantos singelos trocos!...
Escalo todo o meu muro da existência, Sem arnês, nem ferros, só com a alma, Fazendo uso da tanta minha resiliência, Assim trepando e por tal maior calma...
Sirvo-me das pedras e do que houver, Enfiando as mãos por imprecisos buracos, Obstáculos da vida e cujos nos fazem ver, Todas as alturas e precipício dos fracos...
Arrasto-me, no quanto me for possível, Sem olhar qualquer métrica das alturas, Olhando o alto e no que mais concebível...
Para trás ficarão lágrimas e pernas doridas, Uns arranhões feitos por pedras tão duras, Mérito da sobrevivência e honras conseguidas!...