Quem pretende paz, não semeia guerras!... Nem tampouco espanta feras, Subindo ao cume das serras E espicaçando quimeras!... As espadas servem de espelhos, Sempre que limpas e polidas, Podendo ser menções de velhos, Ou de almas que foram feridas!... Não se mandam pedras ao charco, Querendo não ficar molhado, Pois que os salpicos fazem arco... Fazendo nódoas no melhor tecido, Seja no rico, ou qual azarado E ninguém fica agradecido!...
Dar a face gémea, é distorcer a verdade, Procurar nova razão ao esbofeteamento, Procurar cicatrizes, nalguma leviandade E sem que, para tal, exista o argumento...
Há que encontrar amor sem um castigo, Perdoar e mesmo não sendo perdoado, Procurar, nas trevas, tal luz pelo postigo E sem trocar o corpo pela luz do sobrado!
Toda a iluminação será mais que ténue, Embora suficiente para abrir uma porta, Entre a penumbra que nos desconforta...
Fraca e cuja, ao fundo de qual corredor, Nos abre novas janelas para o exterior, Cuja luz nos abrace e ao longe continue!...
As ondas chegam e partem, Sem que de tanto bater se fartem, Em nuvens de tempestade E contra as rochas se partem, Pelas areias ficando a espuma... As gaivotas pipilam de emoção, Sobrevoando a falésia em aflição!... Aguarda-se o timoneiro ao leme, Enquanto as águas baloiçam, Sentindo-se lágrimas salgadas, Gente pobre e de mãos dadas... Vê-se a tristeza de quem geme, De um mar que não se arruma, Neste reboliço e tal ansiedade, Vozes calmas, pra que não oiçam, Mais que nunca de mãos atadas... Pobres gentes, de malfadadas!... Paira um nevoeiro sobre a costa, Linda imagem, para quem gosta, Nessa turbulência de qual destino E o vulgo adora, feito de anjinho, Chorando, desde tenro menino, A igual passarada no seu ninho, Numa chilreada em que sofrem... Amargurado areal e povo lusitano, Olhando, ao longe, o belo oceano!...
A reflexão é a minha alma, No tempo que me foi destinado, Enquanto a disponibilidade se baseia na força de um argumento... A conclusão, é a minha chama e calma, Por lume deveras refinado E ateado no melhor momento!... Deixo água sempre ao lado, Que a floresta está por perto, Nem querendo incendiar o prado, Muito menos o deserto!... Faço a minha reflexão, Ao que oiço com atenção, Não me querendo armar em esperto, Tampouco vender razão E procurando uma solução, Para aqueles a que ando farto!... Visto-me com fato de monge, Atravessando as minhas areias, Seguindo o mosteiro ao longe E sem precisar de quais candeias!...
Sentam-se à mesa, os pecadores, Num canto, no outro os oradores, Negoceiam com os prevaricadores E nenhum faz parte de malfeitores... São todos deveras mais que santos, Ostentando os mais belos mantos, Uns já saíram, entram outros tantos, Só saindo quando estiverem fartos... Fazem rezas e promessas, tão rindo E abraçam-se, enquanto vão saindo, No prato que raparam vão cuspindo E enquanto do trabalho vão fugindo... Enquanto as damas se vão imiscuindo, Tagarelam os senhores, bem ouvindo, Pelo que nada se perde e consentindo, Piscando o olhar a quem vai surgindo... Porém, a madrugada está chegando, Por lindo dia, solarengo, espreitando, Enquanto os escravos se levantando, Pois que o trabalho está esperando... Partem, sem pão que haja na mesa, Bebendo lágrimas de sal pra defesa, Implorando que o dia seja luz acesa, Ao que a idade não perdoa e já pesa... Deitam-se os pecadores e cansados, Da longa noite e tamanhos pecados, À criadagem deixam os seus recados, Havendo que ter sonhos abençoados... Fazer guerras e explorar desgraçados, Semear escravos, os tais esfomeados, Acorrentá-los, por de tão malfadados E nesse prazer se sentem embalados!...
Dançam as nuvens, as estrelas, Dança o Sol com a Lua, As crianças e os velhos, Danças tu, irrequieta e nua, Dançam as palavras e os conselhos E por esperanças de tão belas!... Dançam os pássaros e os lobos, Os peixes, pelos sete mares, Dançam os sãos e os loucos, Ouvem-se cantigas, por roucos, Acompanhando os calcanhares, Seja dos espertos, ou de nabos!... Tudo dança, minha gente, Numa euforia constante, O sangue fervilha, de quente, Dança o puritano e a amante... Dançam as árvores e as serras, As tropas, em final de guerras, Tanto os pobres, como os ricos, Os pratos e os penicos!... Dança o Céu, com o Inferno E Deus corteja o Diabo, Deita-se o Verão com o Inverno, O Outono e a Primavera, Trocando, à vez, de pares E dando do corpo cabo, Essa figura bailando, feita fera, Pulando e faltando os ares... Dança a luz e a escuridão, Por eiras de lusco-fusco, Numa orquestra em confusão, Pela batuta de um tosco!... No átrio tropeça a esperança, Em passos trocados da dança, Os maus dias são lembrança E o futuro uma criança!...
Não sou imortal, Nem sei se gostaria de enfrentar esse futuro... Morrerei, livre e sonhador, na minha imortalidade!... Um dia e quando já tarde, acordarei, Nesse espaço do momento e recuarei... Ao tempo em que tudo era possível e seguro E desses tempos beberei saudade, Sem que algum destino me seja fatal!... Aí, sim, tocarei a imortalidade, sem o além, Saberei, então, dar valor a outro alguém, A todo o existente, Às árvores, em meu redor e que sempre lá estiveram, Mas tampouco as vi E por conseguinte nunca lhes dei valor, Ou com elas convivi!... Ouvirei e entenderei os pássaros, os restantes animais E tanto o demais!... Será tudo um de repente, Embora tudo com outro sabor, Aqueles odores e que sempre me aguardaram, Mas ao que me fiz desentendido E cujo julgamento me é merecido!... O cosmos, esse espaço imortal e belo, Será a minha imortalidade e o selo!... No meio destas notas, senão parvas, Haverá quem as compreenda, Mesmo que ao tempo obsoletas E enquanto as escrevo como oferenda... Serão pensamentos, frágeis larvas, Naquela imortalidade das borboletas!...