Ah, pátria, pátria, que te afogas! Pátria, que te banhas em turvas águas, Que dás de comer a quem te não merece E, quando morreres, parte e te esquece!...
Que te abandona, deixando-nos a doença, Toda a promessa e que foi nossa crença... Levando todas as armas e bagagem, Acompanhados de quanta gatunagem.
Ah, soberba pátria e vendida terra lusa, Que tanto alimentas e quem pior te usa, Servindo de pedra tumular aos restantes...
Àqueles que tanto e mais te merecem, Não aos que pragas semeiam e oferecem, Sonhos em vão, em promessas de feirantes!
Acreditem que estou farto!... Farto de políticos, charlatões, Pessoas que não se respeitam E rastejando, como reles rato, Nem respeitam o meu espaço, Tão-pouco o que melhor faço... Farto de religiões e trafulhas, Nojo duma seita de aldrabões, Gente sem escrúpulos, pulhas, Sem menor pejo que os vejam! Estou farto e quase a vomitar, De uma maioria de hipócritas E vasculho, aquando vou cagar, Numa tentativa de os encontrar, Por entre papel feito de hóstias... Farto, de uma gente sem cultura, Que ao longo de séculos perdura E sem qual intenção de melhorar, Ir, de armas, para as ruas e lutar! Revolta-se-me o fel e estômago, Dá-me coices, este meu âmago, Capaz de tudo, à volta, incendiar E sem saber em quem acreditar... Não há respeito, ou preconceito, Por quantos e que se vá atropelar E o individual querer é um direito, Em que tudo vale, se a pele salvar, Não interessa quem se vá esfolar!... A pele do mais pobre desgraçado, Será luxo de agiota, bem colocado E da carapaça de quanta sapateira, Far-se-á a farinha e sem peneira, Cozinhada no lume da arrogância E tachos, nas chamas da inocência, Para quantos que morrem à fome E no sono de quem melhor dorme... Estou farto, de encolher as tripas E cuspir, ao mundo e cá para fora, Nessa tua benevolência que ficas, Sem entenderes que está na hora! ... Acorda e cria o teu pensamento, Revolta-te, enquanto é momento!... Estou farto deste teatro de um acto, Desta ribalta, nestas cenas de mato!
Ah, como adoro ser tal animal, Ser este genuíno lobo solitário, Saber que poucos me são igual E tanto, ou quanto, celibatário! Como gosto desses tais trilhos E que incessantemente farejo, Cruzando olhares, de sozinhos E fixando prazeres ao que vejo... Perco-me a tamanhos cheiros, Em quantos caminhos que sigo, Por serranias, vales e atoleiros, A que me chamam de mendigo... Que seja e que a tal me pareça, Pois que a severa dor de corno, Que para os tais é uma doença, Seja, para mim, o doce adorno! Ah, como gosto deste meu ver, Solitário, mas dono do mundo, Fazer que de mais puder e vier, Sempre audaz e feito de surdo!... E que me deixem em liberdade, Por minhas sombras e escolhas, Por recantos de minha vontade, Escapando-me por entre folhas. Uivo e estremecendo o silêncio, Pela noite, ou decorrer dos dias E num pior de qualquer anúncio, Escondendo-me de mais arrelias. Ai, que esta minha pele de lobo, Por demais feras serve de veste E que me querem fazer de bobo, Comendo-me o quanto me reste! Ouvem-me, ao longe e tremendo, Sempre que acordo a madrugada, Ficando em tais verdades roendo E no porquê de minha caminhada... Mas sigo, nada havendo a perder, Para a frente e fazendo caminho, Tanto que sou fera, dura de roer E quero tanto continuar sozinho!...
Sou neto de Adelino Nunes, Conhecido por "diabrete" E avó, tal Adelaide de Jesus, Em que nada me compromete, Fazendo bem de meu jus... Tão neto de Jesus, a Margarida, Talvez que muito querida, Morrendo de pouca idade... E de Ladislau da Sertã, Que muito pouco conheci, Por entre tanta saudade, Mas que a génese mereci, Neste minúsculo titã E cunho de tais pronomes... Filho de António Francisco E de Jesus Nunes, a mãe Celeste, Que neste recordar me fico E que ao mundo me deste.