Se eu pudesse voar os céus, Argonauta de passarola, Levava comigo o mundo, Todos os pássaros de gaiola, Dos mais belos sonhos meus E lindas flores na sacola, Olhando a pique e profundo, Nestes remorsos, também teus, Todo o pobre que pede esmola E tão pouco recebe de Deus... Bateria à porta do Céu, Na maior da penitência, Mirando, de esguelha, o Inferno, Nesta minha sapiência, Na humilde qualidade de réu E na lei em que me condeno. Se eu pudesse, levar-te-ia comigo, Mesmo atulhado de pecados, Tanto que és meu amigo E nunca te iria esquecer, Nem o que andas a fazer... Ou levando os teus recados! ... Espreitaria cá para baixo, Condenando tudo o que deixo Em solta chuva de tais sonhos, Num mesclado de odores, Arco-íris de tantas flores, Cobrindo todos os campos Um tanto ao rés do meu queixo E tapando qualquer rebaixo... Tal, se eu pudesse voar, Bem alto... e lá do alto sonhar!
Tudo na vida é questionável... até a vida! Ao longo da vida, questionamos a morte, Indagamos a razão da boa e da má sorte, Questionamos na certeza, na contradição E pela qual não entendes a contrapartida, Sempre que levanto alguma interrogação. As dúvidas são o início de qualquer solução, A luz pelo caminho de quem anda perdido, O princípio do fim no seu profundo sentido, O perfeito no meio de qualquer questão!... Nesta tamanha e de quanta imperfeição, Sinto-me perfeito... dono do meu conceito, Na ilusão e no possível meu maior defeito... Ou talvez, em mim, uma pesada confusão. ... Serei mais uma máquina da sociedade, Corroída, comprada, escrupulosa vaidade, Ou tanto ou quanto diferente dos demais... Senão no errado percurso de tantos mais. Nesta interrogação e demasiado pudica, Fica-me a estagnação de mais incertezas, Talvez de uma mente demasiado lúdica E corrompida por outra de mais certezas. À tanta e derrapante filosofia demarcado, Fico-me, na vergonha da sociedade actual, Em parcial esconderijo, meu ninho recatado E para que não seja a tantos outros igual... Porém, quem serei eu, para tal questionar Os porquês do já demasiado interrogado!? ... Serei, talvez, mais um a observar o voar De qualquer pássaro no infinito, planando E desejoso de alcançar o destino do prazer... Neutro ao que neste mundo anda a fazer!
No primeiro dia seguinte Ao último da minha vida, Gostaria de regressar, Senhor da minha ausência, Elaborar uma lista de partida E de quem não partiu comigo, Deixando qualquer amigo Fora de qual penitência De todo o meu anotar, Mas longe de algum limite. Todas as diversas farsas, Teatros de carpideiras, Meigas falas traiçoeiras, Devolveria em farpas E rico de minhas maneiras... Sendo assim tão inocente, No passado e no presente, Não há perdão que aguente, Nem juízo que eu lamente... Seriam lançados à fogueira E, no abençoar das chamas, Condenados da vida inteira!